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O Romance da Moça Passaro
Limiar
Inés de Parada caminhava diante guiando o caminho. No meio da fraga pintada pelas cerdeiras em flor,um regato cortou o nosso passo. Ágil ainda desde a sua idade avançada saltou por cima da água e dos cachotes de piçarras que o borbulhão não conseguira alastrar. Com a força de seu braço ajudou-nos a cruzar em quanto advertia:
—Cuidado! Não escorregar! Não vos vaia acontecer o da Moça da Montanha.
E ali contou a estória duma moça, vizinha da aldeia, que, por salvar a cabrinha que balava do outro lado das águas, saltou aquele rego que caia a cachão desde o alto da montanha, com menos fortuna que nós e a enxurrada a levou. As palavras saiam da boca de Inês na língua poética dos cancioneiros guardada entre os tesos e os soutos das montanhas do Courel. A nossa cultura milenária fluía dela como os regatos de águas limpas e bravas que descem da serra. E fomos uma com a Terra e o Tempo.
Este romance tenta ser uma homenagem as montanhas da Galiza e a seus habitantes como Inês, que acocharam nossas falas delicadas e harmoniosas, entre as suas paisagens.
Desde as ponlas floridas das cerdeiras , nas landras das sobreiras ou entre as espinhas dos ouriços que rolam polas encostas dos soutos guardando a fartura das castanhas , voa ainda o cantar da moça das águas, "No bicarelo do bico do brelo"*
* Uxio Novo Neira
Romance da Moça Passaro
Nas ponlas dum alto loureiro
Verdes como é verde a i-água
Linda meninha acorda
Sem saber como ali chegara.
Sente um florido canto
Nascido na sua gorja de grana
Que para o vento quiser
Ceivar suas notas livres e claras,
Notas nascidas da i-alma
Na luz do sol da manhã:
Canto da triste rapaza
Que no regato bravio
da enxurrada da montanha,
perdera pé para a sua disgraça.
Cachões d'águas alatraram-a
polos montes de Parada.
Rego traidor, das ladeiras descia
pelas neves se crescia.
em cachoeiras brincava
em fervenças os soutos molhava.
Com a força das suas águas,
Corgas de morte no monte pintara.
As íngremes montanhas
as enxurradas choravam.
Floralinda lindava as cabras
entre aquelas frias campas.
Campo-santo para ela
desque o seu pé resvalara
nas pretas lousas
que as bravas águas levaram.
E a cabrinha perdida
entre as pedras, balava.
Floralinda perdeu pé
Vai a moça para a branha
Revolta nos rodopios
d' água e lama.
—Não te achegues Floralinda
deixa que bale a cabra
que tal animal não vale
o que a tua vida.
Trás de ti vai minha i-alma.
Assim falara Roberto
e assim o moço chorara
ao ver sua Flor mais bonita
alastrada pelas águas.
Cruzando as ladeiras terras
Dos montes de Parada
Entre as pólas do Loureiro
na suas mais altas ramas
Floralinda ficou por sempre,
em doce sono deitada.
Assas azuis dos braços
pouco e pouco lhe medraram
plumas verdes das suas pernas
em linda cauda as mudaram
e um florido trino nasceu
da sua gorja de grana.
Hoje ainda
quando ruge a enxurrada
cálidas notas se escutam
desde o Loureiro,
enchendo os tesos de Parada.
Adela Figueroa Panisse (Lugo). Texto remitido en outubro de 2024. Lugar da lenda: Parada dos Montes (Povoa do Brolhom). Ilustración de Celsa Sánchez.